maio 28, 2016

tricky

Sonhou com ela.

Ela chegava ofegante por ter corrido para encontrá-lo. Ao chegar na sala, tirava o cachecol, o casaco, largava as bolsas. Ele perguntou como havia sido a viagem. Ela hesitou um tempo. Sim, pois é... foi tudo bem. Não pôde aguentar muito tempo. Agarrou-o num abraço. Tinha urgência. Só então conseguiu respirar com calma, suspirar profundamente.

Acordou quando ela beijava levemente seu pescoço.

Passou o café sentindo o seu cheiro.

abril 17, 2016

capturadas

Palavras importam muito. Conseguir combiná-las da melhor forma, para cada ocasião, é uma competência difícil de alcançar. Além de exigir uma formação bem peculiar, colocar em prática uma façanha como essa pressupõe seleção, planejamento, escrita e reescrita, mesmo que o discurso não tenha como objetivo habitar apenas o papel. 

No entanto, tenho achado chato demais ter que sempre selecionar, planejar, escrever e reescrever, medir as coisas que digo. Queria ter um porto seguro para atracar meu verbo sem filtros, sem regulamentações. 

Quem sabe, esse seja o próprio porto. Pelo menos, é o único disponível no momento. Infelizmente, nele as palavras se perdem no silêncio do horizonte. 

janeiro 30, 2016

limbo

É perturbador o quanto pensamos de forma binária. É dia ou noite. Está quente ou frio. Estamos trabalhando ou divertindo-nos. Isso é bom ou ruim. Voto sim ou não. Quero ou não quero. Posso ou não posso. Menino ou menina. Casado ou solteiro. Inteligente ou tapado. Bonito ou feio. Existe ou não existe. Real ou irreal.

Acho que as coisas que mais me prendem a atenção acabam sendo as que não se encaixam nesse mundo dicotômico. As que ficam num limbo, na dúvida, na expectativa de resvalar para algum dos lados, mas sempre se mantendo num equilíbrio sutil e instável de eterna investigação.

Minha cabeça trabalha demais em hipóteses, mas, quem sabe, seja um dos meus maiores prazeres. Não por ser o mais intenso - seria uma injustiça com os prazeres do corpo -, mas por ser o mais constante e o mais autônomo.

janeiro 29, 2016

gatilho

O barulho do vinho caindo na taça é tão peculiar que seria possível ter vontade de servi-lo somente para ouvir aquela sequência de notas e pausas. É acolhedor, intrigante.

Precisava me render a ele. Sentar confortavelmente no sofá, inspirar e expirar calmamente a solidão e proceder a uma suave embriaguez diante da chuva. Às vezes, é preciso não ter companhia.

Então, já com outras disposições, rolar os contatos do celular pode ser inspirador. Ou perigoso.