janeiro 22, 2008

mexe com quem tá quieto...

Já conversavam por horas e horas. Divertiam-se um com o outro.

A cada momento, o impulso que ele sentia em direção a ela parecia mais difícil de segurar. Mas não tinha certeza do que ela sentia por ele, então agüentava o tranco, engolia o desejo.

Depois do jantar, sentaram-se no sofá. Ela tirou as sandálias e sentou com as pernas encolhidas para o lado. Deixou a garrafa na mesa em frente e dividiu o resto do vinho nas taças. Quando a sua secou, deixou-a também na mesa. Repousou o braço na parte alta do encosto e deu apoio à cabeça com a mão.

Por um instante, ele perdeu o rumo da conversa. Ela piscou lentamente e manteve um sorriso sutil. Silêncio.

Nervoso, ele recomeçou a falar, mas finalmente percebeu o olhar dela fixo para seus lábios.

De repente, engoliu o resto do vinho, largou a taça e puxou-a para perto pela cintura.

...

- Esse beijo me deixou completamente amolecida.

- Engraçado...

Sussurando no seu ouvido, ele disse:

... comigo aconteceu um pouco diferente...

janeiro 16, 2008

início

Quando se aposentou, nem considerou a possibilidade de parar de trabalhar. Era muito novo ainda. Sentia-se muito novo ainda.

Ficou mais dez anos com o escritório. Nos primeiros anos acabou até aumentando o ritmo de trabalho. Depois, aprendeu a dosar. Muito mais coisas se tornaram triviais.

Mas chegou o dia em que começou a pensar que seria bom aproveitar o restante da vida... sem os compromissos alheios à sua vontade... sem a beca usual... sem os ambientes de ar condicionado.

Organizou uma lista com os contatos de seus principais pupilos. Meu filho bem que podia estar aqui. O rapaz tinha escolhido jornalismo. E saiu revolucionário, vá entender. De agora em diante, passaria seus clientes para eles.

Quando chegou em casa, na sexta-feira, sentou na poltrona confortável do escritório e suspirou profundamente. Deve ter ficado uns dez minutos ali, ouvindo o silêncio. Levantou-se, abriu o armário ao lado do arquivo, catou dois CDs e ligou o computador. Há tempos não via aquelas fotos. Mas o que realmente lhe chamou a atenção foi uma pasta de páginas html. Ao abrir, foi atropelado sentimentalmente por um antigo blog. Vasculhou quase todos os posts.

Saciado, abriu o último que publicou em tela inteira. Encostou-se na cadeira, apoiou o cotovelo na mesa e alisou a pele escanhoada do rosto sem tirar os olhos do monitor.

De repente, foi em busca do celular.

- Lembra aquele trato? Partidas de xadrez são minhas, as de damas são tuas. Você leva as peças? Vou comprar uma boa garrafa de vinho e vou reservando uma mesa na praça. Beijo.

janeiro 04, 2008

pronta

Nada aconteceu. A oportunidade de dar um tapa na solidão se colocou à frente dela durante horas e horas seguidas. Intermitentemente. Insistentemente. Mas ela olhou nos olhos da sorte e deixou-a passar.


Não era birra ou conservadorismo. Não era medo, de forma alguma. Pela primeira vez na vida, quem sabe, ela tenha ficado feliz de não ter feito nada.


Sentiu-se forte. Sentiu-se esplêndida. Estava só, convictamente, mas não porque queria estar só. Ela não queria mais uma companhia.


A que realmente queria... não o tinha encontrado... ainda.