junho 10, 2006

um passo atrás

Havia gritos. Pessoas puxando e empurrando. O excesso de diferenças entre elas as tornava muito parecidas. Não sei se eu a reconheceria no meio daquele caos.

Engraçado... desde quando acontece isso? Em que momento, pessoas tão próximas fisicamente passaram a ser afetivamente tão distantes? Tão estranhas umas para as outras? Se eu perguntasse a qualquer um daqueles milhares, ninguém saberia me indicar sua direção, mesmo porque, certamente, nenhum deles a conheceria.

Mas ela estava lá. Eu sabia. Não... não havia me dito nada. Fazia muitos anos que havíamos nos distanciado. Eu mesmo tinha dúvidas de que a reconheceria num contato visual muito rápido. É que, semana passada, esbarrei nela no meio da internet. Tropecei. Tão distraidamente quanto aquele menino que parece olhar aquelas formigas. Vês?! Distração típica de uma tristeza latente. Era como eu me sentia. Tudo tão monotonamente igual e cinzento.

Relembrei da sua alegria vendo aqueles pequenos pedaços de intimidade expostos publicamente, mas compartilhados com poucos comentaristas cativos. De repente, flagrei-me quase que investigando os discursos daquelas pessoas, querendo entender mais profundamente até que ponto cada uma delas a conhecia.

Loucura... alguém que por tanto tempo dividiu a cama comigo... eu não mais conhecia. Ou melhor, conhecia, mas, ao vê-la naquela forma, tudo o que passou mais me parecia uma realidade paralela. Lembrei-me da pele, de cada pinta no corpo, do cheiro. Lia suas idiossincrasias e seu brilho voltou-me à mente. Esforcei-me, mas não consegui mais entender a razão de nosso afastamento. Creio que o colorido do passado contaminou-me irremediavelmente o peito. Ah! Como essa pimenta invadiu-me toda a boca. Posso tomar da tua água?

É... senti-me impelido por meu próprio espírito a ir aonde ela fosse. Quando me dei conta da possibilidade de a encontrar... Sabia que era remota. A multidão naquela praia, no último dia do ano, era ainda maior do que eu esperava. Mas, entre as opções que eu tinha, a de buscá-la no meio da multidão era certamente a melhor.

Agora me sinto como um voyer. Espero ocultamente outra oportunidade de esbarrar com seus olhos. Tomá-la em meus braços e refazer todos os nossos erros.

6 comentários:

Mythus disse...

indentifiquei-me totalmente com várias passagens, mas acredito que isso é muito próprio do homem que deixa o coração de lado pra conquistar o sucesso profissional primeiro e se tiver sorte, e se ainda der tempo, e se... Bem, quem sabe que dê pra pra concertar ou aprender antes de errar feito, né?! Pior que a populações de santas nesse mundo tem diminuindo muito nos últimos tempos - sorte de quem acha.

Mythus disse...

eita! errata ali e acolá:

leia-se identifiquei-me...
leia-se ...consertar...

;^)

Anônimo disse...

nossa! esse foi muito bom! boas imagens e ótimas comparações...mas tenho uma dúvida, pura curiosidade gramatical, como sempre gostei do ar de suspense dos seus textos... o emprego do feminino "Não sei se eu a reconheceria..." é mesmo uma mulher ou poderia ser umA pessoa? Você sempre usa o femnino mas, pelo menos para mim não fica claro se é realmente uma mulher....o que é bem legal...hehehe... mas esse ficou muito legal mesmo

Mythus disse...

Saudades de posts e de outras coisas (não tão) mínimas.

às vezes se perde algo por pensar demais.

Banido disse...

Nenhuma leve brisa, perfumada e enebriante, levantada do galopar de idéias puras e selvagens.
O silêncio do livre pensamento açoitado pelas torrentes cármicas da vida.

Anônimo disse...

Adorei o texto. "Engraçado... desde quando acontece isso? Em que momento, pessoas tão próximas fisicamente passaram a ser afetivamente tão distantes?".
Realmente não acho que as pessoas se tornem estranhas, mas sim, que elas apenas vivam mais experiências sozinhas. Isso não significa que não conheçamos mais ela. Conhecemos muito bem os pequenos detalhes, por mais que elas tentem demonstrar as mudanças. E são as "coisas mínimas" que fazem o todo não? Nada muda tanto assim... Aquela pessoa sempre é um pouco da pessoa que conhecemos e com quem convivemos.
Ela continua ali, mas com uma roupa diferente.